quarta-feira, 21 de julho de 2010

DUAS LEMBRANÇAS DE PAULO LEMINSKI



Tenho duas lembranças do poeta Paulo Leminski. A primeira é do começo de 1967, quando eu me preparava para o vestibular. Pretendia então fazer Direito e por isso me matriculei no "Curso Dr. Abreu", que havia ali na rua XV. Ele era o professor de História do cursinho. Assisti uma única aula sua, rica em informação. Parecia um grande urso, movendo-se entre as cadeiras da sala, de casaco e barba negras. Fez uma referência qualquer aos botoques dos lábios inferiores dos nossos indígenas, e a turma toda caiu na gargalhada. Mas ele continuou, com ar sério, sua exposição...

A segunda lembrança é do lançamento do “Catatau” na livraria Ghignone. Isso ocorreu em dezembro de 1975, segundo nos informa Toninho Vaz na sua biografia do poeta ("Paulo Leminski- o bandido que sabia latim"- Rio de Janeiro: Record, 2001). Estive lá a pedido de meu pai, que estava curioso para avaliar o livro, sobre o qual lera comentários na imprensa local. O velho não o conhecia pessoalmente. Por isso, na dedicatória, Leminski lhe enviou um “abraço textual”, expressão que guardei na memória por achá-la singular. Lembro também que nessa ocasião senti forte cheiro de bebida quando o polaco falou...

Mais tarde vim a saber que a gênese do “Catatau” relacionou-se a essa experiência de Leminski como professor de História, antes dele se tornar um publicitário. De repente, dando uma aula, ele imaginou Descartes vivendo no Nordeste brasileiro no tempo dos holandeses... Foi o ponto de partida para o livro.

Gosto da poesia dele, como todo mundo, mas para mim poesia é mais do que mera atividade lúdica. Associo-a à filosofia, e à reflexão sobre os temas eternos da condição humana. Sem esquecer, naturalmente, o prazer estético da linguagem...


Uma vez li em Wilson Martins que Leminski não deixou verdadeiramente uma obra. É mais um talento desperdiçado, acrescento eu, vítima do desregramento e da falta de disciplina interior. Lamentável!